02
Qui, Mai

19º Domingo do Tempo Comum - 13/08/2017

Liturgia

Evangelho Dominical, comentário e mensagem

A fé nos momentos difíceis

1ª Leitura: 1Rs 19,9ª.11-13ª
Sl 84
2ª Leitura: Rm 9,1-5

Evangelho: Mt 14,22-33

* 22 Logo em seguida, Jesus obrigou os discípulos a entrar na barca, e ir na frente, para o outro lado do mar, enquanto ele despedia as multidões. 23 Logo depois de despedir as multidões, Jesus subiu sozinho ao monte, para rezar. Ao anoitecer, Jesus continuava aí sozinho. 24 A barca, porém, já longe da terra, era batida pelas ondas, porque o vento era contrário.

25 Entre as três e as seis da madrugada, Jesus foi até os discípulos, andando sobre o mar. 26 Quando os discípulos o avistaram, andando sobre o mar, ficaram apavorados, e disseram: «É um fantasma!» E gritaram de medo. 27 Jesus, porém, logo lhes disse: «Coragem! Sou eu. Não tenham medo.»

28 Então Pedro lhe disse: «Senhor, se és tu, manda-me ir ao teu encontro, caminhando sobre a água.» 29 Jesus respondeu: «Venha.» Pedro desceu da barca, e começou a andar sobre a água, em direção a Jesus. 30 Mas ficou com medo quando sentiu o vento e, começando a afundar, gritou: «Senhor, salva-me.» 31 Jesus logo estendeu a mão, segurou Pedro, e lhe disse: «Homem fraco na fé, por que você duvidou?»

32 Então eles subiram na barca. E o vento parou. 33 Os que estavam na barca se ajoelharam diante de Jesus, dizendo: «De fato, tu és o Filho de Deus.»

* 22-33: Sobressai aqui a figura de Pedro, protótipo da comunidade que, nas grandes crises, duvida da presença de Jesus em seu meio e, por isso, pede um sinal. E mesmo vendo sinais, continua com medo das ambigüidades da situação e, por isso, a sua fé fica paralisada. Então faz o seu pedido de socorro. Jesus atende ao pedido da comunidade. Mas deixa bem claro que ela precisa crescer na fé e não temer os passos dados dentro das águas agitadas do mundo.

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

 

COMENTÁRIO

O Deus da brisa mansa

Certo dia, frustrado com a incredulidade que ele encontrava na sua luta contra os ídolos em favor do Deus único, Elias fugiu das mãos de Jezabel para a montanha de seu Deus, quase que para provocá-lo a mostrar novamente sua força e a esmagar aqueles que passaram os seus profetas ao fio da espada (1 Rs 19,9-10). Deus o mandou esperar no cume da montanha. Passou um vento violento, mas Deus não estava no vento violento; houve um terremoto, mas Deus não estava no terremoto; houve fogo, mas Deus não estava no fogo. Depois, ouviu-se o murmúrio de uma brisa ligeira.., então, Elias cobriu o rosto e escutou a voz de Deus (1ª leitura).

Deus não está necessariamente nas coisas grandiosas ou violentas. Apesar da violência dos homens, Deus está naquilo que significa paz e refrigério. Dentro da brisa mansa, ele confia a Elias uma nova missão. A religiosidade mágica facilmente acredita que Deus se manifesta na tempestade. Mas ele se manifesta acalmando a tempestade. Assim, ele se manifestou em Cristo, diante dos apóstolos, que estavam lutando contra o vento no barco do lago de Genesaré (Mt 14,22-33).

Por trás dessa narração está um mundo de mitologia. O mar era o domínio de Leviatã, o monstro marinho, uma vez considerado como um deus, mas, mais tarde, desmitologizado até anjo ou diabo. A tempestade era a força do inimigo, acreditavam os supersticiosos pescadores galileus. Ora, depois da multiplicação dos pães (cf. dom. passado) Jesus tinha deixado seus discípulos atravessarem sozinhos o lago de Genesaré.

Ei-los agora confrontados com essas forças, às quais eles atribuíam uma origem maliciosa (evangelho). Aí Jesus inventa dar um passeio andando sobre as ondas. Simão Pedro (só o evangelho de Mt conta este detalhe) se sente logo animado e quer, sobre as ondas, ir ao encontro de Jesus. Mas de repente vê novamente diante de si o vento e aságuas e perde a confiança em si, mas não em Jesus, pois grita “Senhor, salva-me” (cf. tb. salmo responsorial). O que Jesus faz, não sem lhe censurar a falta de fé. E então, com um gesto que revela toda sua majestade, Jesus acalma as ondas. Agora, os discípulos reconhecem-no como o Senhor, o Filho de Deus, e adoram-no.

O Deus que se manifesta em Jesus Cristo não é de tempestade, não é um Leviatã, mas um Deus rico em misericórdia e fidelidade (cf. aquela outra manifestação na montanha, Ex 34,5-6). O que não quer dizer: um Deus de moleza – pois ele tem mais força que a tempestade. Mas ele quer que não tenhamos medo. Não é um Deus que reina na base do medo, mas da confiança, da fé. Ora – e esta é a segunda consideração -, a fé deve ser mais do que um momento passageiro de entusiasmo. Se for só isso, logo de novo vamos, como Pedro, ver surgir o Leviatã de todos os lados. Fé de fogo de palha é pouca fé para Cristo (23). É o que aconteceu com Pedro. “Se és tu, manda-me vir...” (a frase condicional mostra que ele ainda duvidava se era Jesus, manifestando-se como Filho de Deus, ou um fantasma, algum Leviatã; cf. Mt 14,26).

Na 2ª leitura inicia a segunda grande parte de Rm: nos caps. 9-11, Paulo confessa sua paixão para o povo de Israel, do qual ele é membro – embora tenha de combater o legalismo farisaico. Ele mesmo gostaria de ser condenado se, com isso, os seus irmãos judaicos tivessem a salvação (Rm 9,3). Palavra forte, mas não mero exagero: Paulo sabia que seria impossível que eles estivessem pura e simplesmente perdidos. O plano de salvação, mesmo aberto aos gentios, vale também para os judeus. Como? Isso veremos nos próximos domingos. De toda maneira, tanta confiança tem Paulo no plano de Deus que pode dizer: se Israel for totalmente rejeitado, então, eu também!

Acreditamos num Deus que salva (salmo responsorial), que ouve o nosso clamor (canto da entrada), um Deus da mansidão (1ª leitura). Assim, ele se dá a conhecer em Cristo (evangelho). Para nos inteirarmos disso, precisamos de fé, não passageira, mas constante (evangelho, oração final).

(23) No próximo domingo, veremos um exemplo de “muita fé”.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

 

MENSAGEM

Cristo abandonou a Igreja?

As leituras de hoje falam de tempestade e escuridão. Na 1ª leitura, Elias, desanimado, procura Deus no monte no qual este se havia manifestado a Moisés. Deus lhe promete uma “entrevista”. Elias o espera, no vento, no terremoto, no fogo, mas ele não está aí. Depois, porém, surge uma brisa mansa, e Deus lhe fala... No evangelho lemos que, depois da multiplicação dos pães, Jesus manda os discípulos atravessarem o mar, sozinhos. Ele mesmo fica na montanha, para orar. No meio da noite, enquanto os discípulos lutam contra a tempestade, ele vai até eles, andando sobre o mar. Incute-lhes confiança: “Não tenhais medo”. Pedro se entusiasma, quer ir até ele sobre as ondas, mas duvida...

Deus é precedido pela tempestade, mas domina-a. É na calmaria que ele dirige a palavra a Elias. Jesus domina as ondas do lago e dissipa o pânico dos discípulos. Sua manifestação é um convite a ter fé nele. Os doze, o barco, o porta-voz Pedro: tudo isso evoca a Igreja, abalada pelas tempestades da história, enquanto Cristo parece estar demorando para chegar – pois os primeiros cristãos esperavam vivamente e para breve a nova vinda de Cristo, a Parusia, que parecia protelar-se sempre assim. A mensagem da narrativa parece ser que a Igreja deve acreditar na presença confortadora de seu Senhor.Mas nessa fé podem aparecer falhas, como no caso de Pedro...

Que tempestade e escuridão angustiam a Igreja hoje? Cristo nos parece estar longe, não percebemos sua presença... A Igreja como poderosa instituição está sendo atingida pelo desmantelamento da força política que durante muito tempo lhe serviu de sustentáculo: o ocidente europeu e suas extensões coloniais: “Morreu a Cristandade”, o regime no qual Igreja e Sociedade se identificavam. Sociologicamente falando, a Igreja aparece sempre mais como o que ela era no início: uma mera comunidade de fiéis, sem maior peso civil que as sociedades culturais, círculos literários e clubes de futebol (e olhe lá!). Quem ainda não acostumou seus olhos a esses apagamento sociológico, tem dificuldade de enxergar a presença de Cristo.

As dificuldades que a Igreja enfrenta hoje devem nos fazer enxergar melhor a presença de Cristo em novos setores da Igreja, sobretudo na população empobrecida e excluída da sociedade do bem-estar globalizado. De repente, Jesus se manifesta como calmaria no ambiente tempestuoso das “periferias” do mundo, na simplicidade das comunidades nascidas da fé do povo. Temos coragem para ir até ele ou duvidamos ainda, deixando-nos “levar pela onda”?

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes